No extremo noroeste do país, o cacique Ninawa acompanha com preocupação o avanço do novo coronavírus sobre seu povo Huni Kuin. Ainda assim, ele mesmo foi diagnosticado COVID-19, e conversa com a AFP sobre suas preocupações.
São 15.000 membros desse povo indígena que vivem no estado do Acre, na fronteira com o Peru, em um total de 104 aldeias, que no momento estão isoladas em meio à Floresta Amazônica. A AFP conversou com o cacique Ninawa Inu Huni Kuin por meio da plataforma Zoom.
PERGUNTA – Qual é a situação dos Huni Kuin em meio ao novo coronavírus?
RESPOSTA – Temos hoje 15 pessoas infectadas com o novo coronavírus no meu povo, e existe a possibilidade de mais infecções, então as aldeias Huni Kuin hoje no Acre estão ameaçadas. Estamos com grande preocupação porque estamos numa área isolada, sem estradas, com acesso só de barco ou avião.
Não estamos tendo apoio do governos do Brasil, do governo federal, do estado. Trata-se de uma região que não tem suporte para dar apoio aos infectados, e estamos buscando apoio porque muitos estão tendo contado com os já contaminados.
Estamos em busca de apoio para estabelecer uma base de saúde, buscando contato com Médicos Sem Fronteiras e com o Ministério da Saúde para nos ajudar a combater o coronavírus na região.
Precisamos urgentemente de testes rápidos para aqueles que apresentam sintomas, para que possamos separar os infectados de suas famílias, para que não infectem a todos.
Mas como os testes não chegam, estamos muito preocupados porque na próxima semana, no próximo mês, a contaminação será muito grande dentro das nossas aldeias.
Além disso, temos aldeias próximas às cidades, e essas são as mais vulneráveis. Muitos indígenas passam algum tempo nas cidades para se alimentar, mas agora que estão confinados, não podem mais comprar alimentos e enfrentam a falta deles.
P – Como os membros do seu povo reagiram à doença?
R- Muitos não acreditavam que se tratava de uma doença muito grave, que pudesse matar. Mas nós já tivemos óbitos de índios Huni Kuin e de outros povos (indígenas) no estado, falecidos com COVID-19, e isso tem preocupado muito a gente porque o número de casos na região está aumentando.
Hoje todos estão reagindo de forma sensata. Permanecem em casa, já não vão à cidade e não se reúnem. Os que vão à cidade fazem quarentena antes de voltar a sua aldeia.
O povo indígena é considerado muito vulnerável, com imunidade muito baixa. Nós estamos orientando as comunidades a usar a medicina tradicional para aumentar a imunidade. Cuidamos muito das pessoas idosas, crianças e mulheres grávidas, principalmente.
P – Como foi sua própria experiência com a doença?
R- Acabei contraindo o vírus por estar em contato com pessoas que estavam infectadas no trabalho que eu faço, ao articular apoio para ajudar os indígenas mais vulneráveis ao coronavírus.
Estou cumprindo o isolamento social, me isolei imediatamente. Estou fazendo tratamento com o medicamento passado pelo médico e também tomo chás, banho de ervas tradicionais para me fortalecer espiritual e fisicamente.
Passei alguns momentos muito ruins. O coronavírus é um vírus muito forte. Tive muita febre alta, diarreia, dor na barriga, dor no corpo.
Fiquei ruim alguns dias, mas agora estou melhor, me recuperando para seguir lutando e mobilizar apoio para o meu povo que está ameaçado neste momento por esse vírus .
AFP
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