Em documento final da cúpula, russos e chineses deixam de apoiar plano brasileiro
A declaração final da cúpula do Brics, realizada na terça-feira, se tornou mais um obstáculo para que Brasil, Índia e África do Sul desempenhem papéis mais relevantes na ONU. Em um movimento distinto de anos anteriores, quando houve apoio de Rússia e China, a ampliação do Conselho de Segurança e uma vaga para os outros três membros ficaram mais distantes.
“Quando algo entra ou sai da declaração final, nunca é por acaso. São documentos preparados ao longo de meses”, afirmou Oliver Stuenkel, coordenador da pós-graduação em relações internacionais da FGV-SP e autor de um livro sobre o Brics. “Se algo fica no texto ao longo de 11 anos e de repente sai, é por uma razão específica.”
Criado em 2009, o Brics é um grupo informal que permite a Rússia, China, Índia, Brasil e África do Sul maior poder no cenário internacional. Os países fazem cúpulas anuais – a última ocorreu de forma virtual.
Para Stuenkel, a Rússia não retiraria esse trecho por iniciativa própria, pois em comunicações anteriores não manifestou desconforto. “É muito provável que seja iniciativa chinesa, especialmente porque a relação com o Brasil e com a Índia passa por uma crise.”
Apesar de apoiar uma reforma na ONU, a China se opõe à entrada no Conselho de Segurança de rivais regionais, como Japão e Índia, aliados do Brasil na busca pela ampliação do órgão, explica o diplomata Fausto Godoy, que serviu em Mumbai, Pequim e Tóquio. “Há dois países (Índia e Brasil) que querem de qualquer maneira entrar e há a China e a Rússia, que não querem ampliar porque perderão poder”, afirmou Godoy. Procurada, a Embaixada da China no Brasil não se manifestou.
Em uma de suas declarações na cúpula, o presidente Jair Bolsonaro disse que o Brics precisa “apoiar as legítimas aspirações de Brasil, Índia e África do Sul a assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU”.
A reforma do Conselho de Segurança, estabelecido após a fundação da ONU, em 1945, é uma velha reivindicação da diplomacia brasileira. No entanto, segundo o diplomata Roberto Abdenur, ex-embaixador na China e na Alemanha, a atual gestão do Itamaraty rompeu com a tradição da política externa conduzida até o final de 2018 de lutar por uma vaga permanente.
“Não creio que o Itamaraty tenha ficado desagradado com a mudança na declaração do Brics, pois não havia feito esforços para a reforma do Conselho de Segurança nos últimos dois anos.”
Por Paulo Beraldo
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