Numerosos estudos mostraram que em média 1 em cada 3 pessoas com covid-19 terá sintomas que duram mais do que duas semanas. E afetam não apenas as pessoas que estavam muito doentes e hospitalizadas, mas também aquelas com casos mais leves
The Conversation – Há alguns meses, um jovem atleta veio à minha clínica, onde sou médica infectologista e pesquisadora de imunologia de covid-19. Ele se sentia cansado o tempo todo e, o que era importante para ele, estava tendo dificuldades para praticar mountain bike. Três meses antes, ele havia testado positivo para a doença. Ele é o tipo de pessoa que você espera que tenha alguns dias com sintomas leves antes de se recuperar totalmente. Mas quando ele entrou na minha clínica, ainda estava apresentando sintomas de covid-19 e não conseguia praticar mountain bike no nível em que era capaz antes.
Dezenas de milhões de americanos foram infectados e sobreviveram à covid-19. Felizmente, muitos sobreviventes voltam a uma condição normal de saúde no período de duas semanas após ficarem doentes, mas para alguns sobreviventes da doença – incluindo meu paciente – os sintomas podem persistir por meses. Esses sobreviventes às vezes são chamados de long-haulers, e o processo da doença é denominado covid longa, persistente ou síndrome de pós-covid. Um long-hauler é qualquer pessoa que continuou com os sintomas após um ataque inicial de covid-19.
Numerosos estudos nos últimos meses mostraram que em média 1 em cada 3 pessoas com covid-19 terá sintomas que duram mais do que as duas semanas. Esses sintomas afetam não apenas as pessoas que estavam muito doentes e hospitalizadas, mas também aquelas com casos mais leves.
Os sintomas comuns da ‘covid longa’ ou ‘covid persistente’
Muitos long-haulers experimentam os mesmos sintomas que tiveram durante sua luta inicial contra a covid-19 , como fadiga, deficiência cognitiva (ou névoa mental), dificuldade para respirar, dores de cabeça, dificuldade para se exercitar, depressão, dificuldades para dormir e perda do paladar ou cheiro. Em minha experiência, os sintomas dos pacientes parecem ser menos graves do que quando estavam inicialmente doentes.
Alguns long-haulers também desenvolvem novos sintomas. Isso pode variar muito de pessoa para pessoa, e há relatos de tudo, desde perda de cabelo até taquicardia e ansiedade.
Quem são os long-haulers?
Pacientes que foram hospitalizados em decorrência da covid-19 são os mais propensos a ter sintomas persistentes de longo prazo.
Em um estudo publicado em julho de 2020, pesquisadores italianos acompanharam 147 pacientes que haviam sido hospitalizados pela doença e descobriram que 87% ainda apresentavam sintomas 60 dias após terem alta do hospital. Um estudo mais recente, publicado em janeiro, descobriu que 76% dos pacientes hospitalizados em Wuhan, na China, ainda apresentavam sintomas seis meses depois de adoecer.
Este estudo de Wuhan foi particularmente interessante porque os pesquisadores usaram medidas objetivas para avaliar as pessoas que relataram sintomas persistentes. As pessoas no estudo ainda relatavam problemas respiratórios persistentes seis meses depois de adoecer. Quando os pesquisadores realizaram tomografias para observar os pulmões dos pacientes, muitos exames mostraram manchas chamadas de opacidades em vidro fosco. Provavelmente, isso representa inflamações decorrentes de pneumonia viral causada pelo SARS-CoV-2. Além disso, as pessoas neste estudo que tinham covid-19 grave não conseguiam andar tão rápido quanto aquelas cujas doenças eram menos graves – esses problemas pulmonares reduziram a quantidade de oxigênio que estava passando de seus pulmões para a corrente sanguínea. E, lembre-se, tudo isso foi medido seis meses após a infecção.
Outros pesquisadores descobriram efeitos semelhantes. Um estudo encontrou evidências de pneumonia viral em curso três meses depois que os pacientes deixaram o hospital. Outro estudo com 100 pacientes alemães com covid-19 descobriu que 60% tinham inflamações no coração dois a três meses após a infecção inicial. Esses pacientes alemães eram relativamente jovens e saudáveis – a idade média era de 49 anos e muitos não precisaram de hospitalização quando tiveram a doença.
Os pacientes mais afetados pela covid-19 não são os únicos a sofrer com sua forma prolongada. Pacientes que tiveram sintomas mais brandos, sem necessidade de hospitalização, também podem ter sintomas persistentes.
De acordo com uma pesquisa recente feita por Centers for Disease Control and Prevention, 35% dos pacientes não hospitalizados que tiveram casos leves de covid-19 não retornaram ao estado de saúde inicial 14 a 21 dias após o início dos sintomas. E isso não acontecia apenas em pessoas mais velhas ou com problemas de saúde latentes. Cerca de 20% dos indivíduos previamente saudáveis de 18 a 34 anos apresentavam sintomas contínuos. No geral, a pesquisa mostra que até um terço dos indivíduos que tiveram a doença e não foram hospitalizados continuarão apresentando sintomas até três meses depois.
Para colocar esses números em contexto, apenas 10% das pessoas que contraem a gripe ainda estão doentes após 14 dias.
Sintomas de longo prazo, efeitos de longo prazo
A comunidade médica ainda não sabe por quanto tempo esses sintomas persistirão ou por que ocorrem.
De acordo com pesquisas recentes que ainda não foram revisadas por pares, muitos long-haulers não podem retornar ao trabalho ou realizar atividades normais devido à névoa do cérebro, dor ou fadiga debilitante. Antes de meu paciente adoecer, ele subia de bicicleta uma montanha em nossa cidade do Colorado quase todos os dias. Ele levou quatro meses para se recuperar ao ponto de poder escalá-la novamente.
O SARS-CoV-2 afeta as pessoas de maneiras distintas daquilo que a comunidade médica originalmente reconheceu. Na Colorado State University, meus colegas e eu estamos estudando long-haulers e explorando se os desequilíbrios do sistema imunológico desempenham um papel no processo da doença. Nossa equipe e muitos outros estão trabalhando diligentemente para identificar os pacientes com covid longa para entender melhor por que os sintomas persistem e, mais importante, para descobrir como a comunidade médica pode ajudar.
* Stephanie LaVergne é cientista-pesquisadora da Colorado State University
Fonte: Rede Brasil Atual – RBA
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