O momento mais esperado do carnaval do Rio de Janeiro, o desfile das escolas de samba, traz para a passarela neste domingo e segunda-feira seu tradicional excesso de penas e glitter, mas também uma alta dose de crítica social e política.
É o primeiro carnaval desde que o representante da extrema-direita Jair Bolsonaro foi eleito presidente, impulsionado por uma onda conservadora e grupos de evangélicos neopentecostais que não costumam comungar com os excessos carnais deste festival popular.
No total, catorze escolas de samba do “grupo especial” – a elite do carnaval carioca – desfilarão pela Avenida Marquês de Sapucaí, popularmente conhecida como Sambódromo, contando uma história através da música, da dança e de seus trajes elaborados.
E eles estão dispostos a andar os 700 metros da passarela, mesmo que a previsão de tempestade neste verão seja cumprida. Os desfiles começam às 21h15 e duram até altas horas da madrugada (a última deve terminar, se não houver revezes, às 04H18), sob os olhares e aplausos de mais de 70 mil cariocas e turistas brasileiros e estrangeiros, em um dos festivais mais populares do planeta.
– Mulheres, índios, tolerância religiosa –
O destaque desse domingo é a atual campeão, Beija-Flor. A escola que no ano passado foi coroada com um desfile criticando a corrupção e a violência, preparou para esta edição um enredo autobiográfico, “As Fábulas da Beija-Flor”, para celebrar seus 70 carnavais de existência.
Também desfilam as tradicionais Unidos da Tijuca – que contará a história do pão – e Salgueiro, que homenageará Xangô, um dos deuses do candomblé, patrono da Justiça, que promete trazer críticas ao sistema judiciário brasileiro.
Na segunda-feira as duas maiores campeãs vão desfilar. Uma delas é Portela, que buscará seu 23º título, homenageando a cantora brasileira Clara Nunes, ícone musical dos anos 70 e a primeira artista de seu tempo a defender publicamente as religiões afro-brasileiras. A escola tradicional tem uma ala especial com fantasias desenhadas pelo estilista francês Jean-Paul Gaultier.
A outra, Mangueira, agremiação verde e rosa que conquistou seu 19º título em 2016, entra na avenida com o “lado B” da história brasileira, exaltando heróis e heroínas negras, indianas e pobres, relegados para segundo plano na narrativa tradicional.
Entre eles, a escola relembra a vereadora negra Marielle Franco, uma forte defensora dos direitos humanos nas favelas do Rio, assassinada em março do ano passado.
A Paraíso do Tuiuti, que no ano passado foi vice-campeã com um enredo que criticou o racismo e retratou o então presidente Michel Temer como um vampiro – uma crítica a sua reforma dos direitos trabalhistas -, este ano mantém o tom da crítica política, mas com toques de humor, contando a história de um personagem folclórico do nordeste do país, o bode Ioiô.
Pelo terceiro ano consecutivo, as escolas de samba enfrentam restrições orçamentárias: o subsídio que recebem da Prefeitura foi reduzido de 1 milhão para 500.000 reais.
Marcelo Crivella, um ex-bispo evangélico eleito em 2016, evita participar ativamente, como seus antecessores, do festival. Neste ano esteve ausente na entrega simbólica da chave da cidade para o “Rei Momo”, um homem corpulento e jovial que se torna o guardião do Rio durante o feriado.
– Sete milhões de “festeiros” –
Fora da disputa acirrada do Sambódromo, que pode acomodar cerca de 72 mil espectadores, realiza-se desde sexta-feira uma festa mais informal, regada a música e álcool: os blocos de rua, arrastando multidões fantasiadas por vários bairros da cidade.
No total, as autoridades esperam que sete milhões de pessoas – incluindo um milhão e meio de turistas – participem dessa gigantesca festa ao ar livre.
Estão planejados 498 blocos, 15% a menos que em 2018, quando foram 608.
O tradicional Cordão do Bola Preta, por outro lado, reuniu ontem mais de um milhão de pessoas no centro da cidade, em seu 101º desfile.
AFP
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