Em entrevista à CNN Brasil, a médica Ludhmila Hajjar confirma recusa ao convite do presidente Bolsonaro para ser ministra da Saúde e conta que foi ameaçada
A médica Ludhmila Hajjar confirmou em entrevista à CNN Brasil que recusou o convite do presidente Jair Bolsonaro para assumir o Ministério da Saúde e substituir o atual ministro, o general Eduardo Pazuello.
“Sou médica, cientista, especialista em cardiologia e terapia intensiva, tenho toda minhas expectativas em relação à pandemia. O que eu vi, o que eu aprendi está acima de qualquer ideologia e acima de qualquer expectativa que não seja pautada em ciência”, disse a médica, que conversou com o presidente no domingo e nesta segunda-feira, 15, em Brasília
Hajjar, que recebeu apoio de políticos, entre eles o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que faltou convergência entre ela e Bolsonaro. “O presidente ficou muito preocupado da minha gestão não agradar alguns grupos, de sofrer ataques. Um novo ministro tem que vir para ajudar o presidente, para deixar o ambiente tranquilo, ambiente que não foi possível de ser criado entre nós.”
O que precisa ser feito
Na entrevista, Hajjar defendeu quatro medidas urgentes: ativação de novos leitos; um protocolo nacional de tratamento para pacientes internados ; vacinação em massa e, por fim, busca de remédios novos – como os anticorpos monoclonais.
Ela sugeriu também a união de sociedades médicas para treinamento de pessoal, que não estão recebendo treinamento adequado para entubar pacientes. A médica, que dirige uma clínica particular em São Paulo, é professora da Associação de Cardiologia da Faculdade de Medicina da USP, diretora de tecnologia e inovação da Sociedade Brasileira de Cardiologia, coordenadora de cardio-oncologia do InCor.
Para a médica cardiologista, a ciência já demonstrou que o paciente precisa ser visto precocemente. Mas disse também que remédios, como cloroquina, ivermectina e azitromicina, não se mostraram eficazes no tratamento da doença. Essas drogas foram sugeridas pelo presidente Bolsonaro e pelo Ministério da Saúde como parte de um tratamento precoce para combater a pandemia.
“No início da pandemia, muitos de nós, inclusive eu, prescrevemos cloroquinas. Queríamos uma salvação, estávamos no desespero. Até que nós fomos lidando com os resultados que a ciência nos traz: inumeros estudos provaram isso. E por isso, esse é um assunto do passado para mim.”, disse Hajjar.
A médica defende medidas que a colocam em oposição ao presidente Bolsonaro: “Já foi demonstrado que o lockdown salva vidas. É claro que tem gente morrendo de fome, que o impacto social é gigantesco, mas é por isso que centralização de um ministério forte serviria para coordenar tudo. Às vezes, o lockdown é necessário sim.”
E mais: “Se não houver uma mudança de política imediata, eu não vejo dias melhores pela frente”, disse Hajjar. “Enquanto continuarmos negando, vão vai ter solução.”
Ameaças
Hajjar disse também que, após seu nome ser cotado para a vaga, ela sofreu ameaças. “O número do meu celular foi divulgado em vários grupos de whatssapp. Tentaram entrar no meu quarto duas vezes durante a noite (no hotel em que estava hospedada em Brasília). Fico assustada, mas não tenho medo porque a causa é maior. Uma pessoa da sociedade civil, querendo o bem do país, sofrer esse tipo de agressão, isso me assusta. Boa parte dos maus resultados que o Brasil tem hoje são consequencia desse comportamento”, disse a médica.
“Para alguns, esse nosso encontro não foi muito agradável. E as pessoas fizeram de tudo para que não houvesse uma convergência entre nós”, disse ela.
Para a médica cardiologista, o país acumula erros: “Acho que o Brasil até o momento errou no combate à pandemia. O Brasil subestimou a doença no início, faltou muita discussão e eficiência na compra de vacinas – e hoje estamos pagando o preço disso -, um discurso de alinhamento, medidas eficientes de combate à pandemia. Agora, o Brasil precisa mudar. O que é bom precisa continuar, mas o que não está dando certo precisa ser combatido.”
Por Fabiane Stefano e Gabriel Justo
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