Braço da OMS nas Américas afirma que, apesar de aumento de testagem, vários estados brasileiros continuam registrando alta de casos; país está próximo de bater 100 mil mortes
SÃO PAULO – Próximo de alcançar 100 mil mortes por Covid-19, o Brasil continua em situação crítica e não deve “cantar vitória” sobre a pandemia do novo coronavírus, alertaram autoridades da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) nesta terça-feira.
Questionada pelo GLOBO sobre a incidência da doença no país, a direção do braço da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas disse que o Brasil não está em condições de relaxar as medidas de combate à doença.
— A situação no Brasil continua crítica. Não se pode cantar vitória, e o importante é continuar implementando as medidas não-farmacêuticas recomendadas pelos organismos internacionais para detecção, gestão e prevenção de casos — afirmou Marcos Espinal, diretor do Departamento de Doenças Transmissíveis da Opas.
É cedo também, disse, para pensar em um achatamento da curva de casos.
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— Há um sinal de esperança. No final de julho, o Brasil relatava sete mil novos casos diariamente, e isso baixou um pouco. Mas é uma situação difícil, porque é um país tão vasto. Embora a testagem tenha aumentado, ainda há áreas onde o vírus continua fazendo estrago. Não se deve pensar que já se está achatando a curva (de casos) — afirmou Espinal.
Segundo ele, há uma expectativa sobre o comportamento da pandemia no país nas próximas semanas.
— Temos que esperar para ver o que acontece. Há comunidades em São Paulo, Distrito Federal e Bahia que ainda relatam grande quantidade de casos e mortes — reforçou.
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Volta às aulas
As autoridades da Opas também comentaram o retorno às aulas presenciais, tema amplamente discutido no Brasil e em outras regiões do continente. Segundo o médico brasileiro Jarbas Barbosa, vice-diretor da Opas, só se poderia falar em reabertura quando a transmissão do coronavírus estiver controlada.
Ele lembrou que países que retomaram as aulas sem controle da transmissão comunitária experimentaram novos surtos, enquanto outros que preferiram reabrir após esse controle tiveram relativa segurança.
— Sem controle da transmissão local, reabrir escolas é fator de risco para novos surtos — disse Barbosa.
Além disso, ressaltou, é crucial investir em testagem, rastreamento de contatos, máscaras e medidas de precaução nesse processo.
— É essencial ter em conta o controle de transmissão no processo de reabertura e depois, quando for o momento, adotar um protocolo para garantir a segurança de alunos e professores — acrescentou.
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Paradoxo na saúde
Segundo a Opas, a América Latina registrou ontem 9,7 milhões de casos de Covid-19.
— A América Latina continua sob controle da pandemia. E os números seguem aumentando — lamentou a diretora-geral da Opas, Carissa Etienne.
Segundo ela, a região enfrenta um paradoxo na saúde pública:
— Muitos países notificam recorde de novas infecções, em um sinal claro de que o vírus se propaga rapidamente. Ao mesmo tempo, há uma pressão frequente para reabertura de escolas, da economia, e de seguir com a vida normal.
Para a diretora da Opas, a Covid ainda demorará a desaparecer.
— Essa pandemia é uma realidade à qual devemos nos adaptar, seguindo com a implantação de medidas ativas para controlar o vírus e usando os dados da propagação do vírus para calibrar nossas ações — afirmou.
Carissa Etienne lembrou, também, que a pandemia não é o único problema de saúde para a região.
— Começamos a ver sinais de advertência do impacto devastador em outras doenças. Sabemos que catástrofes sanitárias podem sobrecarregar os sistemas de saúde, com consequências graves — afirmou.
A diretora-geral da Opas citou o exemplo do surto de ebola na República Democrática do Congo:
— O sistema de saúde lutou para conter os casos que se propagavam no país, e como resultado outros serviços perderam prioridade. Campanhas de vacinação foram afetadas, e 3.400 crianças acabaram infectadas por sarampo — destacou.
Para Carissa, a incidência de desafios como esse podem durar anos. Segundo ela, com a Covid, temos o risco de repetir essa história.
— Precisamos assegurar que nosso sistema de saúde seja resistente e que tenha os insumos e profissionais necessários para lutar contra a pandemia e manter as pessoas saudáveis para outras doenças. Quando isso não está sob controle, surgem outros desafios igualmente nocivos — alertou. — Devemos chegar a um equilíbrio justo, e devemos fazer isso juntos.
Elisa Martins – Globo
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