Bolsonaro tem primeiro encontro, ainda que virtual, com presidente da China depois de críticas à vacina chinesa
BRASÍLIA — A cúpula dos Brics, nesta terça-feira, foi o primeiro encontro, ainda que virtual, do presidente Jair Bolsonaro com o presidente da China, Xi Jinping, depois que o brasileiro envolveu o país e a vacina chinesa Coronavac em sua briga pessoal com o governador de São Paulo, João Dória (PSDB), e apontou para uma clara divisão no bloco, com direito a críticas veladas de um lado e do outro.
Ao abrir seu discurso com uma fala de improviso, Bolsonaro citou rapidamente que o Brasil estava “em sintonia” com o restante dos países na busca de uma vacina para a Covid-19 “segura e eficaz”, depois de Xi Jinping ter enfatizado o fato de a China ser um dos países que está à frente na pesquisa pelo imunizante e que estaria disposto a distribuí-lo para os demais países do bloco.
Para além das farpas, a fala dos dois presidentes marcou claramente as diferenças que cada vez mais têm afastado China e Brasil, apesar do relacionamento comercial intenso — o país asiático é o principal importador do Brasil — e do próprio Brics, formado por Brasil, China, Rússia, Índia e África do Sul.
Multilateralismo, defesa das instituições internacionais como a Organização das Nações Unidas e a Organização Mundial da Saúde e controle do aquecimento global foram alguns dos temas citados pelo presidente chinês que caminham em oposição às posições hoje defendidas pelo Brasil.
— Devemos superar as divisões com a unidade e colocar o máximo esforço para combater o vírus — disse Xi Jinping, acrescentando que a epidemia não pode ser usada para que barreiras sejam criadas. — A prática de usar a pandemia para perseguir o fim da globalização prejudica o mundo.
Falando antes de Bolsonaro, Xi Jinping ainda defendeu que os países mantenham “propósitos e princípios” da Carta das Nações Unidas e um sistema internacional centrado na ONU para evitar hegemonismos e políticas de disputa de poder.
Do seu lado, Bolsonaro foi em direção oposta. Ao mesmo tempo em que afirmava que o Brasil estava aberto a investidores e ao comércio internacional, defendeu mais uma vez que é preciso defender a democracia e as “prerrogativas soberanas dos países.”
— É preciso ressaltar que a crise mostrou a centralidade das nações para a solução dos problemas que hoje acometem o mundo. Temos que reconhecer a realidade que não foram os organismos internacionais que superaram o desafio, mas sim a coordenação entre os nossos países — afirmou Bolsonaro.
O presidente ainda defendeu a reforma da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Organização Mundial do Comércio (OMC), dois pontos em que segue a política do presidente americano, Donald Trump. Em julho o republicano enviou uma carta à OMS dizendo que o país estava se retirando da OMS, em um movimento que Bolsonaro ameaçou copiar, mas não levou adiante.
Uma das queixas de Trump, repetidas pelo presidente brasileiro, seria uma suposta influência exagerada da China sobre a organização.
Enquanto Xi Jinping defendia a organização, Bolsonaro afirmou:
— Desde o início critiquei também a politização do vírus e o pretenso monopólio do conhecimento por parte da OMS, que necessita urgentemente, sim, reformas.
O presidente brasileiro ainda pediu, mais uma vez, uma reforma na OMC.
— A reforma da OMC é fundamental para retomada do crescimento econômico global. É necessário prestigiar propostas de redução dos subsídios para bens agrícolas com a mesma ênfase que alguns países buscam promover o comércio de bens industriais — afirmou.
Tema recorrente da diplomacia brasileira, alterações na OMC chegaram a um impasse com um bloqueio nas negociações provocado por exigências do governo Trump.
Em relação ao meio ambiente, as diferenças entre China e Brasil também apareceram. Enquanto o presidente chinês prometeu transformar seu país em uma economia neutra em emissão de carbono até 2060 e defendeu a implementação do Acordo de Paris — do qual Bolsonaro também já considerou sair — o presidente brasileiro usou seu discurso para dizer que iria revelar uma lista de países que comprariam madeira extraída ilegalmente do Brasil.
Por Lisandra Paraguassu, da Reuters
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