Sondagens setoriais da FGV apontam queda das expectativas no comércio, indústria, serviços e construção civil. Inflação da “porta de fábrica” atinge 33% em 12 meses
Enquanto Jair Bolsonaro, acometido por raro surto de sincericídio, diz que “nada está tão ruim que não possa piorar” e que é “um zero à esquerda” em economia, seu ministro da área, Paulo Guedes, continua a viver em um Brasil idealizado, onde a economia está “voando”. Na vida real, as sondagens setoriais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostram que falta cada vez mais credibilidade no tanque do “posto Ipiranga”.
Os indicadores que vêm sendo divulgados esta semana pelo Instituto Brasileiro de Economia da instituição (FGV Ibre) revelam uma generalizada reversão das expectativas. A confiança do Comércio recuou 6,8 pontos, atingindo o menor nível desde maio. A da Indústria registrou a segunda queda consecutiva após quatro meses de alta. A do setor de Serviços também recuou, interrompendo sequência de cinco altas consecutivas. A Construção Civil ainda mantém estabilidade, embora já comece a oscilar para baixo.
“A confiança do comércio encerra o terceiro trimestre em queda. O resultado negativo é fruto da combinação de piora tanto da percepção sobre o volume de vendas no presente quanto das expectativas, gerando dúvidas sobre o ritmo de retomada nos próximos meses”, avalia Rodolpho Tobler, coordenador da Sondagem do Comércio do FGV Ibre. “A maior cautela dos consumidores tem sido um obstáculo importante, assim como a inflação recente e o cenário ainda delicado do mercado de trabalho.”
Em setembro, o Índice de Confiança do Comércio (ICOM) recuou 6,8 pontos, para 94,1 pontos, contra 93,7 pontos em maio. A queda foi disseminada nos seis principais segmentos do setor resultou da combinação da piora tanto da percepção do momento presente quanto das expectativas.
“É importante ressaltar que os últimos dados do terceiro trimestre já mostram uma desaceleração da retomada do setor, acendendo o sinal amarelo sobre o desempenho do setor no final do ano”, completa Tobler.
Já o Índice de Confiança da Indústria (ICI) caiu 0,6 ponto em setembro, para 106,4 pontos, segundo mês consecutivo de queda após quatro meses de altas. O resultado é influenciado principalmente pelas perspectivas para os próximos meses. A queda do otimismo para a produção e tendência dos negócios também rebaixou as intenções de contratações, com redução de 0,4 ponto no indicador de emprego previsto.
“Embora a indústria tenha apresentado boa recuperação no segundo semestre de 2020, vem encontrando dificuldades para manter o ritmo da retomada ao longo de 2021. As percepções quanto à situação presente e futura vêm oscilando em decorrência de pressões de custo, alto desemprego, instabilidades econômicas e institucionais”, comenta a economista do FGV Ibre Claudia Perdigão.
“Nesse contexto, soma-se ainda a crise hídrica, que contribui para elevar a pressão inflacionária e as incertezas quanto à possibilidade de expansão da produção nos próximos meses, tornando mais pessimistas as expectativas para o final do ano principalmente entre os segmentos intensivos no uso de energia elétrica”, finaliza.
O Índice de Confiança de Serviços (ICS) caiu 2,0 pontos em setembro, para 97,3 pontos, interrompendo sequência de cinco altas. “Nesse mês, o resultado foi mais influenciado pela revisão das expectativas em relação aos próximos meses, mas também foi afetado pela percepção de ligeira piora na percepção da situação corrente”, avalia Tobler.
“Alguns fatores podem frear o ritmo de recuperação, como: a recente queda da confiança do consumidor, lenta recuperação do mercado de trabalho, inflação e incertezas relacionadas ao controle da pandemia”, conclui o economista do FGV Ibre.
Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos de Construção do FGV Ibre, afirma que a Sondagem da Construção aponta estabilidade na confiança do setor, mas com uma composição diferente. Enquanto o humor dos empresários com a situação atual avança, as expectativas em relação ao futuro, campo onde o otimismo foi maior em quase todos os meses desde o início da pandemia, registrou um pequeno recuo.
“A elevação de taxas do crédito imobiliário por bancos privados deve estar entre os fatores que acenderam o alerta amarelo dos atores do setor, embora ainda estejam em um nível mais favorável do que o de 2015-17”, afirma a economista. “Grau de endividamento das famílias, alto nível de desemprego e inflação alta e mais disseminada também são fatores que pesam nessa equação e reverberam na Sondagem.”
Índice de Preços
Conhecido como “inflação da porta de fábrica”, por não considerar impostos e fretes, o Índice de Preços ao Produtor (IPP) calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) subiu 1,86% em agosto, na comparação com julho. A alta foi de 23,55% no acumulado do ano e de 33,08% no acumulado em 12 meses até agosto.
Pela segunda vez na série histórica do IPP, iniciada em 2010, os preços das 24 atividades tiveram variações positivas. Em julho de 2021, 20 das 24 atividades já registravam variação positiva. O indicador abrange as grandes categorias econômicas: bens de capital, bens intermediários e bens de consumo (duráveis, semiduráveis e não duráveis).
A “inflação da porta de fábrica” tem impacto direto sobre a carestia como um todo. A previsão do mercado financeiro para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do país, subiu de 8,35% para 8,45% neste ano. É a 25ª elevação consecutiva na projeção.
Prévia da inflação oficial, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) acelerou de 0,89% em agosto para 1,14% em setembro. Segundo o IBGE, “trata-se do maior resultado para o mês de setembro desde o início do Plano Real, em 1994, quando ficou em 1,63%”, além de ser a maior taxa da série histórica do indicador desde fevereiro de 2016, quando ficou em 1,42%.
No ano, o IPCA-15 acumula alta de 7,02%. No acumulado em 12 meses, superou os dois dígitos, ficando em 10,05%, ou quase o dobro do teto da meta estabelecida para este ano, que é de 5,25%. Essa está mesmo “voando”.
Fonte: PT Notícias com informações da Agência FGV Ibre
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