A meses de completar 16 anos, Rodrigo Kutz já decidiu: não será neste ano que exercerá seu direito ao voto, porque não se sente representado por nenhum candidato a presidente, um caso que ilustra o desinteresse crescente dos jovens brasileiros pela política.
“Me sinto longe do Bolsonaro, me sinto longe do Lula. Não me agrada nenhum dos polos”, diz o estudante de Brasília. “Talvez um candidato mais novo fizesse mais sentido para mim. Espero que, na próxima, haja outras opções, que apareçam candidatos mais interessantes.”
O Brasil é um dos nove países onde os jovens podem votar nas eleições nacionais a partir dos 16 anos, direito previsto na Constituição de 1988, que tornou o voto obrigatório a partir dos 18 anos.
A participação juvenil, no entanto, pode cair para o menor nível em 30 anos, uma vez que, a um mês de se esgotar o prazo, o número de jovens de 16 e 17 anos cadastrados é pouco superior a 850.000, uma queda de 60% em uma década.
Em 2018, quando Bolsonaro foi eleito, 1,4 milhão de jovens foram às urnas, já mostrando uma tendência de queda.
“Meus pais me incentivaram a votar, mas ainda não estou ligado em política”, conta o estudante de Brasília Eduardo Proença, aluno do ensino público. “Vejo políticos brigando para ver quem é menos pior. Isso não me anima, não pretendo votar agora.”
– Jovens tratados ‘passivamente’ –
A falta de entusiasmo gerou um movimento para engajar os jovens, que inclui desde a cantora pop Anitta até as próprias autoridades eleitorais.
“Me pediu foto quando me encontrou em algum lugar? Se for maior de 16, só tiro a foto se tiver foto do título de eleitor”, tuitou Anitta, que se posiciona abertamente contra Bolsonaro.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou campanhas nas redes sociais. Com uma linguagem informal, atores e atrizes negros, indígenas e brancos apresentaram o slogan “Bora Votar!”.
“Eles precisam se engajar para decidir o futuro, pois o pior voto é aquele não dado”, disse o ministro Edson Fachin, presidente do TSE, em nota enviada à AFP.
A preocupação com a inserção no mercado de trabalho, agravada pela pandemia, somada aos escândalos de corrupção dos últimos anos, que levaram ao descrédito dos partidos, explicam parte do “desânimo” nessa faixa, segundo o cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas Marco Antônio Teixeira.
O analista cita, ainda, a falta de identificação dos jovens com os principais candidatos e a pouca renovação geracional nos partidos.
Os partidos brasileiros “são espaços muito hierarquizados pelas direções e famílias tradicionais. A juventude é tratada de forma passiva”, diz Teixeira.
– ‘Por mim, eu não iria’ –
Segundo as pesquisas, perfila-se uma disputa no segundo turno entre Bolsonaro e Lula, que tentará o terceiro mandato.
Marco Antônio May, 18, não esconde sua insatisfação por ter que ir às urnas pela primeira vez: “Por mim, eu não iria. Infelizmente, não vejo os políticos se preocupando muito com os jovens. O Brasil tem dois candidatos fortíssimos, que costumam olhar para as coisas de forma extremista, e isso me desmotiva.”
Os candidatos, no entanto, também apelam para os jovens, especialmente Bolsonaro, que está em clara desvantagem entre esse grupo, segundo as pesquisas.
O presidente pediu aos “pais e avós” que convençam os jovens a não votar em seu provável adversário, mencionando “para onde estava indo o Brasil” com os governos de esquerda de Lula (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2016), referindo-se à economia e aos escândalos de corrupção.
Segundo pesquisa do instituto Datafolha, Lula tem uma vantagem de 29 pontos sobre Bolsonaro na faixa entre 16 e 24 anos para o primeiro turno, em 2 de outubro, frente a 17 pontos considerando todo o eleitorado.
AFP
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