Brasil

Mandetta, um ministro acrobata entre Bolsonaro e a realidade do coronavírus

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, junto ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em Brasília. Foto: AFP/Arquivos / Sergio LIMA

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem realizado uma mescla de experiência técnica e audácia política para capitanear “a partir da ciência” o combate ao coronavírus, contrariando o presidente Jair Bolsonaro, que é cético diante da pandemia.

Há dois meses, quando a COVID-19 estava totalmente distante do Brasil, o atual ministro, que é um ortopedista pediátrico e político com ampla experiência em gestão sanitária, começou a participar de coletivas de imprensa televisionadas que alertavam que mais cedo ou mais tarde o vírus chegaria ao país e que se aproximavam meses “extremamente duros”.

Com seu jaleco azul que lhe dá o ar de técnico sobre o momento, sua oratória calma e didática, além de sua voz que passa segurança, pouco a pouco foi ganhando a confiança dos brasileiros à medida que a pandemia – que até o momento deixou 300 mortos no Brasil – se agrava.

Porém, o mais difícil para Mandetta, de 55 anos, não tem sido transmitir certa calma em um país onde a pandemia acarretará um possível drama social, mas coincidir sua visão, que leva em consideração as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), com as opiniões do seu chefe direto, Bolsonaro.

Até a última terça, o presidente considerava o coronavírus como uma “gripezinha” e, justificando querer evitar o caos social e econômico, fazia campanha para o fim da quarentena que está em vigor na maior parte do planeta.

– “Escute mais o presidente” –

À princípio, Mandetta tentava justificar a postura de Bolsonaro, que por sua vez é apoiado principalmente por empresários e igrejas neopentecostais, mas nos últimos dias deixou claro que está a favor do “máximo distanciamento social” como forma de combate à pandemia.

“Só trabalho com o que é ciência”, afirmou.

Uma postura que incomodou o presidente, que na última semana não ficou satisfeito ao saber que Mandetta era o membro do governo mais bem avaliado em relação à gestão da pandemia no país, em destaque até mesmo em relação a ele próprio.

Bolsonaro também se incomodou porque na coletiva de imprensa da última terça, o ministro da Saúde foi apoiado por outros dois ministros, Sérgio Moro (Justiça) e Paulo Guedes (Economia), que endossou as medidas de distanciamento social “de acordo com as orientações de Mandetta”.

“Eu não pretendo demiti-lo durante a guerra”, disse Bolsonaro nesta quinta à rádio Jovem Pan.

“Nenhum ministro meu é indemissível. Ele deveria ouvir um pouco mais o presidente da República. Está faltando mais humildade a Mandetta”, alertou.

Na última terça, Bolsonaro tinha lhe deixado de fora de uma reunião com médicos. E esse não foi o primeiro momento delicado: no último domingo, contrariando as orientações de Mandetta de respeitar o distanciamento social, saiu para passear por Brasília, visitou um mercado popular e tirou fotos com seus seguidores.

– Um “fiel escudeiro” –

Nascido em Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, Mandetta começou sua carreira na gestão da saúde, trabalhando em locais como a Secretaria Municipal da Saúde de sua cidade natal. Depois, foi por duas vezes deputado federal, entre os anos de 2010 e 2018, pela sigla DEM.

Em Brasília, conheceu o então deputado Bolsonaro, a quem se uniu em oposição à ex-presidente Dilma Rousseff (2011-2016), principalmente em relação ao programa “Mais Médicos”. Em 2019, se tornou um dos poucos ministros com experiência política no governo atual.

“O Mandetta foi um fiel escudeiro do presidente, um dos poucos que acreditou nas chances do Bolsonaro quando poucos o faziam. Participou ativamente da campanha e da elaboração do programa de governo de Bolsonaro”, afirma o especialista em política, Thiago Vidal, da consultoria Prospectiva.

“O problema é que, agora, o discurso técnico do ministro é bastante conflitante com o discurso político do presidente. E, por isso, o ministro está sendo ofuscado pelo governo”, acrescenta Vidal.

Há um mês e meio, quando lhe perguntaram se pretendia se candidatar a algum cargo nas próximas eleições, Mandetta respondeu: “Em 2022 estarei trabalhando ao lado de Jair Bolsonaro”, por sua reeleição.

AFP

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