Última vez que a caderneta não teve ganho real foi em 2015. Veja alternativas e situações em que a poupança ainda é indicada.
Com a taxa básica de juros em novo piso histórico – 4,5% ao ano –, a rentabilidade da caderneta de poupança passou a perder para a inflação projetada para os próximos 12 meses. Ou seja, o investimento mais popular do Brasil ainda menos atrativo em 2020.
Segundo a regra em vigor desde 2012, quando a Selic está abaixo de 8,5%, a correção anual da caderneta de poupança é limitada a um percentual equivalente a 70% dos juros básicos mais a Taxa Referencial (TR, que está em zero desde 2017).
Cálculo da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade) mostra que, com a Selic a 4,5% ao ano, a poupança passou a render apenas 0,26% ao mês e 3,15% ano ano, deixando de ser capaz de proteger o valor aplicado nesta modalidade das perdas inflacionárias projetadas para 2020.
A projeção atual do mercado para a inflação oficial (IPCA) no ano que vem é de 3,6%, segundo a pesquisa Focus do Banco Central. Os analistas também preveem a taxa Selic em 4,5% no fim de 2020. Ou seja, confirmadas estas previsões, a poupança terminará 2020 com um retorno negativo de 0,43%.
Levantamento da Economatica mostra que a última vez em que a caderneta de poupança não teve ganho real no acumulado no ano foi em 2015. Veja gráfico abaixo:
Simulação de perda para cada R$ 1 mil depositados
Na prática, a projeção de retorno negativo significa que parte do dinheiro depositado na poupança será corroída pela inflação ao longo do ano.
O professor da FGV, Fábio Gallo, explica que quem depositar R$ 1 mil na poupança poderá sacar daqui a 12 meses R$ 1.031,50. Descontada a inflação projetada, no entanto, o montante cairá para R$ 994,37. Ou seja, o investidores terá uma perda real de R$ 5,63.
“Ninguém gosta de saber que, descontada, a inflação, vai estar perdendo”, resume o economista. “Mas também é errado falar que não vale nada investir na poupança. A renda fixa tem que ser vista como parte da carteira para reduzir o risco”.
Segundo os planejadores financeiros, diante do novo momento da economia, o brasileiro vai precisar avaliar outras opções de investimento, inclusive forma da renda fixa, e tomar um pouco mais de risco para conseguir melhores retornos.
“A poupança é uma aplicação popular, fácil, tem sua finalidade. Mas deve ser vista como reserva de curto prazo, muito curto prazo”, afirma Reinaldo Domingos, presidente da Associação de Educadores Financeiros (Abefin).
Para quem a poupança ainda vale a pena?
Apesar da perda de rentabilidade, especialistas avaliam que a poupança continua representando uma boa opção de investimento em algumas situações:
Para aqueles que guardam dinheiro em casa;
Pessoas com pouco dinheiro e que conseguem economizar apenas pequenas quantias a cada mês;
Para quem busca aplicações com possibilidade de resgate de curto prazo, daqui a alguns meses;
Para quem quer ter um “fundo de reserva” para emergências, já que o dinheiro pode ser sacado a qualquer momento;
Para investimentos mantidos na chamada poupança antiga (depósitos realizados até maio de 2012), cujo rendimento permanece em 6,17% ao ano.
“Para aquele dinheirinho de curto prazo não será errado porque, pelo menos, recupera uma parte da inflação”, afirma Gallo.
Outra vantagem é que os rendimentos da caderneta de poupança são isentos do pagamento de imposto de renda e de taxa de administração.
É importante, porém, ficar sempre atento a data de aniversário da aplicação, pois o rendimento não é diário, e sim mensal. Ou seja, quem retira algum dinheiro antes do intervalo de 30 dias, fica sem receber parte do acréscimo de juros de rentabilidade.
Poupança ainda supera rendimento de muitos fundos
Mesmo com o rendimento achatado, a poupança vai continuar sendo uma opção de investimento melhor que as de muitos fundos de investimento, principalmente aqueles cujas taxas de administração sejam superiores a 1% ao ano.
Cálculos da associação mostram que, com a Selic a 4,5% ao ano, fundos de investimentos cuja taxa de administração seja de 1,5% ao ano oferecerão em 12 meses rendimento nominal de apenas 3,04%. Nos fundos que cobram taxa de administração de 2% ao ano, a rentabilidade projetada é de 2,92% ao ano. Já nos fundos com taxa de 3% ao ano, o retorno nominal cai para apenas 2,43%.
Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), taxas de administração médias menores que 1% são oferecidas apenas aplicações acima de R$ 25 mil. Para aplicações até R$ 1 mil, a taxa média atual é de 1,93%.
“As cadernetas de poupanças vão continuar se destacando frente aos fundos de renda fixa pelo fato de que não pagam imposto de renda nem taxas de administração”, observa Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo de estudos e pesquisas econômicas da Anefac.
Comparativo de aplicações em renda fixa
De uma maneira geral, todos os investimentos de renda fixa atrelados à Selic ou que acompanham a Selic tendem a ter os rendimentos achatados em 2020.
Levantamento do buscador de investimentos Yubb mostra que há opções de renda fixa (nas quais o investidor sabe previamente qual será a remuneração) com rentabilidade média projetada superior à da poupança em 2020. Entre elas, estão CDB, Letra de Crédito Imobiliário (LCI), Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e debêntures (títulos de dívidas de empresas). Veja quadro abaixo:
Vale observar, entretanto, que dependendo da modalidade, a rentabilidade projetada está condicionada a um prazo maior de permanência dos recursos na aplicação.
“É preciso comparar os investimentos à luz não só dos custos e das taxas líquidas e pensar também na liquidez, nos prazos que você vai precisar do dinheiro”, orienta Gallo.
Fuga de recursos da poupança e alternativas
Dados do Banco Central mostram que, no acumulado no ano até novembro, os saques superaram os depósitos em poupança, resultando em uma retirada líquida de R$ 3,884 bilhões. Essa foi a maior saída para o período desde 2016, quando o saldo negativo foi de R$ 51,370 bilhões.
O volume de recursos aplicados em caderneta de poupança no Brasil, no entanto, ainda soma mais de R$ 825 bilhões.
Segundo os analistas, a tendência é uma maior migração de recursos para outras opções de investimento tanto na renda fixa como na variável.
Na lista de opções de investimento com maior risco mas com chance de uma rentabilidade maior estão os fundos de ações, multimercados (que podem aplicar recursos em títulos, moedas e ações) e imobiliários, além de títulos de dívidas de empresas (debêntures e certificados de recebíveis) e papéis de longo prazo do Tesouro Direto.
A sucessão de recordes da Bovespa em 2019 é em grande medida explicada que maior entrada de investidores. Em 2019, a quantidade de brasileiros que investem na bolsa praticamente dobrou, chegando a 1,6 milhão de pessoas físicas, segundo dados da B3.
A indústria de fundos também já detectou esse movimento de maior busca por diversificação. Segundo dados da Anbima, de janeiro a novembro os fundos de renda fixa perderam R$ 3,9 bilhões, na comparação ao mesmo período do ano passado, enquanto que os fundos de ações receberam aportes de R$ 67,5 bilhões e os fundos multimercados captaram R$ 57,4 bilhões.
Antes de buscar rentabilidades mais altas, a recomendação é sempre formar uma reserva de emergência em aplicações de baixo risco e que ofereçam liquidez diária. E a regra de ouro continua sendo planejamento, acompanhamento dos mercados e diversificação.
“É certo que não dá para ficar mais só na renda fixa. Se você ficar só na renda fixa vai ter perdas muito maiores. Agora, todos os seus ovos na mesma cesta, mesmo com a renda fixa remunerando menos, seria uma loucura”, diz Domingos.
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