Já está muito claro que abandonar garantias de manutenção da renda, apostar em informalidade, estimular terceirização, fugir do Judiciário e desistir do trabalho publicamente regulado não está funcionando.
por Rodrigo Trindade
O título acima é de reportagem do UOL, e diversos veículos de imprensa brasileiros têm apresentado seus diferentes graus de decepção com a Reforma Trabalhista de 2017. O “Surpreso?” ficou por nossa licença.
Aprendemos que não é educado ficar se gabando, dizer que acertamos e o outro errou, mas tem horas que é importante levantar bem alto a plaquinha “eu avisei”. E não foram nem poucos, nem isolados, os alertas. Em lugar algum do planeta precarizar trabalho, obstaculizar o Judiciário e apostar em atividades informais e desguarnecidas de regulação pública funcionou para gerar crescimento econômico – muito menos desenvolvimento. Já era assim em 2017.
Direito do Trabalho não é cegonha de empregos, essa é a função das políticas públicas habilitadas para promoverem condições de crescimento econômico via demanda de produção e consumo. Se houver gestão política minimamente tranquila, melhor ainda. Mas leis ruins de Direito do Trabalho atrapalham – ah, e como vêm atrapalhando.
Em 2017, quando se intensificaram as legislações que vieram a ser conhecidas como Reforma Trabalhista, a propaganda oficial focou na “parte comercial” do produto: fracionamento de férias e disciplina de ações incertas e excessivas eram as preferidas dos novos especialistas televisivos. O que não apareceu foi a essência: uma séria de disposições que, ao permitirem economias imediatistas de obrigações sociais, pudessem levar à explosão de terceirizações, atravancamento judiciário, informalidade e farra de contratações nos mais diversos itens do cardápio de precarização. Conseguiram tudo isso.
O problema foi que muita gente levou o produto para casa, sem perceber o conjunto da obra. O resultado nesses anos leva a pensar em fechar a lojinha, e o último a sair que apague a luz do aeroporto. O desemprego está estabilizado em índices pornográficos, com quase 32 milhões de brasileiros trabalhando menos do que gostariam, ou simplesmente desocupados. Entre esses, há 4 milhões que, simplesmente, não encontram espaço no mercado há mais de dois anos, o dobro de 2016. A partir do ano seguinte à Reforma, houve duplicação do emprego informal – o nome gourmetizado para trabalho ilegal, em que há sonegação direitos trabalhistas e previdenciários básicos.
Ah, mas foi a pandemia. Não, não foi. Até o início da emergência sanitária, o emprego informal era o que mais crescia no país, e o desemprego, já bastante alto, não era muito diferente do que temos hoje. As flechinhas dos gráficos seguem iguais.
Além de estagnação econômica e desindustrialização, a redução da renda na última década já chega em 26,2% para a metade mais pobre do país – dados da FGV Social. Com o crescimento da informalidade nos trabalhos com menos renda, o problema já começa a ser estrutural, montada nos ainda incivilizados serviços por plataformas digitais, e suas resistências em aceitar jurisdição e cumprimento de obrigações sociais.
Já está muito claro que abandonar garantias de manutenção da renda, apostar em informalidade, estimular terceirização, fugir do Judiciário e desistir do trabalho publicamente regulado não está funcionando. E não vai funcionar. Não é orgulho de ter acertado, é esperança que os equívocos não se repitam, e a plaquinha nunca mais precise ser levantada. Oxalá!
* Rodrigo Trindade é professor universitário, ex-Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região – AMATRA IV, juiz do Trabalho na 4ª Região.
Fonte: Revisão Trabalhista
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